Amor perdido~Capítulo 03




A temperatura abaixou bruscamente e Phel decidiu acender uma fogueira. Pegou gravetos e um esqueiro que tinha guardado no bolso da camisa.
– Você fuma? - Eu disse, quebrando o silêncio.

– Não, não. Eu guardo um esqueiro no bolso da camisa para que eu possa usar em situações como essa. - Disse ironicamente.
Eu ia rebater sua brincadeira mas fui interrompida por um ronco sonoro vindo do meu estômago.
– Desculpa, é que eu não como faz dois dias.. - Não consegui esconder meu constrangimento.
– Você consegue esperar até amanhecer? Não iremos encontrar nada nessa escuridão.
– Tudo bem.
Phel me envolveu em seus braços e logo adormeci.
Quando o sol nasceu, fomos à procura de algo para comer. Foi então que nos deparamos com uma goiabeira. Não me contive e peguei um fruto. A goiaba estava machucada e, provavelmente, estava cheia de bichos em seu interior.
Não exitei e dei uma mordida. O gosto era amargo mas comi tudo.Normalmente eu nem comeria essa goiaba com a aparência horrível já que tinha muita frescura quando se tratava de comida. Lembro que minha mãe sempre me dizia que, um dia, eu iria esquecer isso e dar lugar à necessidade. Agora eu entendia.
Decidimos seguir adiante em nossa procura pelo caminho de volta. Foi então que ouvimos vozes e passos próximos. Não demorou muito para que dois guardas florestais surgissem de trás das árvores. Depois de explicarmos o ocorrido, eles nos guiaram para fora daquela floresta sem fim.
Durante a caminhada, Phel foi andando na frente com o guarda mais baixinho enquanto eu caminhava à alguns metros atrás com o alto e moreno.
– Eu vi alguma coisa na televisão sobre um desaparecimento por aqui mas não achei que vocês estariam tão perto da estrada. Acho que estavam andando em círculos.
– Em círculos?- Disse, indignada. - Eu passei os últimos três dias dentro de uma floresta, quase morri de fome e você vem me dizer que estávamos andando em círculos? É o cúmulo.
O guarda deu uma risada abafada. Alguns minutos depois avistamos a estrada atrás de uma árvore grande e aparentemente velha.
Seguimos de carro até a cidade mais próxima. De lá liguei para minha mãe e, depois de uma hora, seu carro esportivo prata parou em frente a delegacia de polícia na qual fomos deixados pelos guardas florestais.
– Ah, meu Deus Bella! Eu achei que tinha acontecido o pior com você! - Minha mãe estava chorando, o que fez com que eu começasse a chorar também.
– Eu senti sua falta, mãe. Eu achei que ia morrer lá.. - Não conseguia falar mais nada pois já soluçava.
Quando me acalmei, olhei de relance para Phel e vi seu pai chegando e dando um tapinha em seu ombro. Ele encontrou meus olhos e ficamos nos encarando por alguns segundos antes dele entrar no carro e desaparecer na estrada.
~~**~~
Avistei minha casa de longe. Era uma casa de esquina, talvez a maior do quarteirão; branca; o gramado estava mais verde que nunca e o portão já havia sido pintado novamente.
Quase chorei quando, ao entrar, senti o cheiro de bolo de chocolate que a Marisa, minha empregada, sempre faz. Aquele aroma me trazia lembranças maravilhosas. Uma delas aconteceu nas férias há cinco anos.
Meu pai havia prometido me levar à praia naquele dia mas, inesperadamente, choveu. Eu chorava muito e para compensar, meu pai decidiu fazer uma praia na sala. Forramos um lençol cor de areia no chão, pegamos nossas cadeiras de praia, boias e guarda-sóis. Ficamos brincando a tarde toda. No final, Marisa fez seu famoso bolo de chocolate e comemos.
– A nossa praia é diferente: Tem bolo de chocolate, não temos que passar protetor solar grudento e podemos usar a imaginação. - Disse meu pai me olhando com seus olhos castanhos que sempre me acalmavam.
Depois de dois anos meu pai faleceu. Nunca me conformei por ter sido uma morte causada por uma pessoa bêbada e irresponsável no trânsito.
Minha mãe entrou em depressão depois disso e ficava isolada em seu quarto. Quem cuidava de mim era Marisa. Ela me dava conselhos e ficava a noite toda comigo quando minha febre constante aumentava.
– Bella, minha princesinha! - Marisa me abraçou e senti minha blusa ficar molhada por conta das lágrimas da minha segunda mãe.

~~**~~
Subi a escada e fui em direção ao meu quarto. Estava do mesmo jeito que eu havia deixado. A cama ficava encostada na parede abaixo da janela e em frente a porta; meu criado mudo ficava do lado direito da cama sustentando meu abajur e meu despertador. Na parede esquerda ficava meu guarda-roupa que sempre vivia bagunçado, na parede direita ficava minha escrivaninha e meu computador. Era um quarto simples mas era onde eu me sentia confortável, era meu refúgio.
Me joguei em cima da cama macia e acolhedora.
– Senti falta disso..
Me levantei e abri meu guarda-roupa para escolher um pijama confortável. Foi então que lembrei que tinha deixado minhas malas no acampamento. Meu melhor pijama estava lá, pensei.
Me contentei com um shortinho e blusinha e fui tomar banho. A água percorria meu corpo, era revigorante. Passei a esponja ensaboada pelo meu corpo. O corpo que Phel havia tocado há um dia. Como será que Phel estava? O que ele estava fazendo?
Sei que nunca mais no veríamos e isso me deixava desconfortável. Eu queria poder olhar e me perder em seus olhos azuis como o céu mais uma vez.
Quando saí do banho meu telefone tocou. Era Gabi.
– Bella, você está bem? Me desculpe por não ter ido com você. Eu estava tão preocupada. Achei que você tivesse morrido...- Gabi não parava de falar. Parecia mais uma metralhadora de palavras.
– Eu estou bem, Gabi. Não se culpe, você estava com catapora, né? - Disse quase soltando uma risada.
– Olha, eu tenho que te confessar uma coisa...
– Eu já sei, amiga. Depois você me conta como foi passar uns dias com o Alex. Bom, vou jantar. Amanhã nos falamos, beijo.
– Beijo, te amo. - Eu conseguia perceber seu tom de alívio e excitação.
Eu a conhecia desde a morte do meu pai. Gabi sempre me confortava nos momentos difíceis e eu fazia o mesmo quando era possível. Gabi é a melhor amiga que eu já tive.
~~**~~
Minhas férias se resumiram a depoimentos para a polícia. Tive que ficar repetindo a história milhares de vezes. Quando me dei conta, já era dia 31 de janeiro.
No dia seguinte eu ia ser uma estudante do ensino médio. Eu ia para uma escola nova, conhecer pessoas novas e tentar esquecer tudo o que havia acontecido nesse verão.
Quando amanheceu, me levantei, tomei banho, escovei meus dentes e me vesti.
A campainha tocou e fui atender a porta. Era Gabi. Seus cabelos loiros estavam presos em um coque. Ela estava usando uma calça skinny quase igual a minha, no pé ela usava sapatilha. Sua maquiagem estava exagerada como sempre. Seus olhos verdes estavam contornados com lápis e delineador, suas bochechas estava levemente rosadas por conta do blush e seu batom era vermelho.
– Aonde você vai, Gabi? Pra uma festa? - Disse, rindo.
– Ai, você não sabe o que é estilo. Vamos.
Peguei minha bolsa e seguimos até o carro de Gabi que era conduzido por um motorista velho e ranzinza.
Depois de vinte minutos, estacionamos em frente à imensa escola. Prodigy High School.
Enquanto admirava a fachada, uma pessoa me chamou atenção. Era um garoto de cabelos negros. Eu o conhecia.
Era Phelipe.

escrita por NYA




Nenhum comentário:

Postar um comentário